quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

DE VOLTA À HEMODIÁLISE


Infelizmente acabou.  Depois de onze anos saudável, meu rim transplantado não aguentou mais a carga imposta sobre si. O fato é que, apesar dos momentos felizes vividos nesse período, houve também excesso de visitas aos blocos cirúrgicos. As várias intervenções cirúrgicas a que fui submetido minaram a resistência do nobre órgão. Assim, desde agosto de 2011, conto com a ajuda das máquinas de hemodiálise do Centro Nefrológico de Formiga.

Após quatro meses na nova experiência, continuo contando com a bênção Divina, pois tenho a sorte de poder dispor de um centro de hemodiálise de alto padrão na própria cidade que moro. Isso é privilégio para moradores de poucas cidades no Brasil; Formiga é uma delas.

Acho importante informar aos amigos de minha cidade e região, que nosso Centro é dotado de equipamentos modernos, equipe de médicos competentes, enfermeiros capacitados e corteses, bem como funcionários eficientes e educados. Completam o quadro, uma psicóloga e um nutricionista. No dia a dia do atendimento, além da experiência e a capacidade profissional empregada no processo do tratamento, são servidos aos pacientes lanches, almoço ou jantar, antes e após as sessões. Nosso Centro recebe também, pacientes de várias cidades da redondeza, que diariamente mandam suas “Vans” em direção a Formiga, mantendo viva a esperança de dezenas de pessoas.
Além de poder contar com o moderno Centro de hemodiálise pertinho da minha casa, estou tendo a certeza de que o tratamento está sendo eficiente. Os resultados da filtragem artificial me fazem sentir melhor. Agradeço a Deus por existir o processo de hemodiálise para os pacientes com insuficiência renal porque, fosse o problema em outro órgão, nem possibilidade do uso da máquina existiria. Portanto eu e os outros com problemas nefrológicos ainda podemos nos considerar sortudos.

A rotina e o modo de tratamento são mais ou menos assim: no início, as coisas são mais difíceis, pois para um paciente se submeter ao processo de hemodiálise, é necessária a confecção de uma fístula no braço. Fístula é uma modificação que se faz na veia, ligando-a a uma artéria. Ela se torna capaz de suportar um maior fluxo de sangue e pode ser puncionada com mais segurança. Essa mudança no organismo é uma cirurgia relativamente simples; porém atualmente essas intervenções estão sendo feitas em Divinópolis ou Belo Horizonte.
Acontece que esta fístula demora em torno de quarenta e cinco dias para amadurecer - ou seja, só depois de mais de um mês, o braço estará cicatrizado e preparado para receber as agulhas do aparelho. Dessa forma, até que se processe esse amadurecimento, torna-se necessário inserir um cateter em uma veia, para que o paciente possa ser submetido ao tratamento dialítico, até que a fístula esteja em condições de uso. Esse cateter é introduzido na veia cava superior, à altura do pescoço – jugular -. Não sendo possível interceptá-la nessa altura, o cateter é instalado na femoral, bem próxima à virilha. O cateter torna as coisas mais difíceis, pois incomoda e interfere nos movimentos do paciente. Porém, apesar de incômodo, o implante e o uso do cateter podem ser tolerados; exigindo, é claro, uma boa dose de paciência.

No meu caso, já são quatro meses tolerando o cateter, pois só agora consegui fazer a tal fístula. Como nem tudo são flores e as coisas sempre acontecem comigo acompanhadas de outros problemas, desta vez não foi diferente. Porém, desde o início do processo de hemodiálise, vem me atormentando com dor intensa, uma úlcera venosa localizada na perna (causada pelas várias tromboses, que foram causadas pelo câncer). Diante disso, os cirurgiões, temendo uma infecção maior, se recusavam a executar a feitura da fístula. Assim, com cateter no pescoço e às vezes na perna, venho administrando as inconveniências que a situação me impõe e vou tolerando os incômodos que me desafiam. Pelo que já passei, essa questão do cateter é “mole”. A hemodiálise, então, nem se fala; acho tranquila. Afinal, tudo isso tem me feito bem. Estou realmente muito satisfeito com o tratamento.

Já tive a oportunidade de fazer a filtragem do sangue através de um processo de diálise doméstico. Isso se deu antes do meu transplante. O tratamento consistia em trocar um líquido que era colocado dentro do abdômen, mais precisamente no interior do peritônio. Isto se dava também, através de cateter  implantado na região próxima ao umbigo. Esse líquido absorvia as toxinas do organismo num tempo de cinco a seis horas de ação. Depois, esse líquido era trocado por outro, em um processo que durava em torno de quarenta minutos. Essas trocas de líquidos aconteciam quatro vezes por dia: pela manhã, ao meio-dia, à tarde e à noite. Durante todo o período, executei cerca de três mil trocas desse líquido. Depois de dois anos nessa lida, recebi de presente do meu irmão Gerson, um rim - o que me manteve vivo até hoje.

Sem perder a esperança de viver mais algum tempo, desta vez optei pelo processo tradicional de diálise. Resolvi experimentar, três vezes por semana, as quatro horas que a máquina exige para filtragem. Estou contente, pois descobri que optei pelo processo e pelo caminho certo, pois apesar da frieza da máquina e o fato da gente ter que possuir uma paciência “de Jó”, tudo é compensado pelo calor humano dos companheiros de hemodiálise. É muito gratificante chegar ao Centro de Hemodiálise e, juntamente com os demais, tomar café no refeitório antes da sessão. A maioria é gente muito simples e – apesar do sofrimento de cada um, todos são simpáticos e alegres; estão sempre sorrindo. E não é raro, que até dentro das salas de execução de diálise, volta e meia o riso aparece. Seja com piadas ou casos engraçados, os assuntos acabam envolvendo a todos em um clima positivo e alegre, apesar de tudo.

Dessa forma, vou continuar jogando minhas fichas na companhia desse pessoal. Lá, sinto-me integrar uma espécie de irmandade, onde flui uma energia que faz bem. Ao invés de me submeter diariamente ao processo de diálise peritoneal, na solidão de um quartinho que pode ser preparado em casa, é preferível estar lá, com a turma, nessa espécie de “comunidade”. Também, esta é uma boa oportunidade oferecida pela vida para se praticar a humildade. Afinal, evoluir espiritualmente é necessário.
A todos, um grande abraço. E não descuidem da saúde, principalmente da pressão arterial.



Gilberto Lobato
Cine & Foto - Submarino.com.br