sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

CELEBRANDO UMA GRANDE MULHER!


“Gilberto, continue firme e não amoleça; eu sempre vou estar ao seu lado”.

Esta frase eu sempre ouço nos momentos difíceis em que, vez ou outra, meus pensamentos insistem em me importunar.

São doces e fortalecedoras palavras que minha mulher me diz quando sinto que o amanhã parece invisível. Quando isso acontece, geralmente não estou sentindo nenhum tipo de dor, são aqueles momentos em que baixa uma espécie de tristeza, e minha consciência insiste em me mostrar a realidade. Não que eu fuja dela, pelo contrário, sou até muito realista. No entanto, prefiro viver o hoje com mais força, deixando o amanhã para o futuro. Nessas horas - eu sempre deitado - a Elzi chega sem que eu esteja esperando, observa que estou chateado, me afaga e me diz as palavras acima. Depois permanece um tempo comigo naquela posição. Nesse momento fico calado. Continuo calado, não consigo falar nada. Quando a Elzi me diz isso, ela tem consciência que sei de tudo que está acontecendo, e o que vai acontecer, porém ela sabe também que estas palavras me confortam muito.

Desde que comecei a fazer uso deste blog para relatar minhas experiências, vocês, meus amigos, têm acompanhado minha saga. Verdadeiramente passo a vocês a maneira com que encaro os desafios; sempre com muita Fé e muito otimismo. Mas esta minha postura só está sendo possível pela confiança que tenho em Deus e onde agradeço à minha família pela semente plantada e pela estrutura que existe ao meu redor. Falo tanto da estrutura física quanto da psicológica.

Em estrutura física, sou privilegiado. Tenho tudo que é necessário para viver e lutar com dignidade. Quanto ao apoio psicológico, sou mais afortunado ainda, pois tenho vários médicos que me assistem e inúmeros amigos que torcem e oram por mim, sem contar minha família, que é maravilhosa. Porém, hoje gostaria de me referir à minha esposa. Ela, sim, é a responsável maior pela minha sobrevivência!

Grandes são as mulheres. Já dizia o nobre compositor que é mentira absurda a mulher ser o sexo frágil. Ele, Erasmo Carlos, eternizou a grandeza delas, com a canção: Mulher (Sexo Frágil). Nela, o amigo do rei, afirma que a “força” está com a mulher que faz parte de sua rotina e que sua sabedoria não tem preço. O autor prossegue enaltecendo sua mulher com muita inspiração e termina dizendo que na escola em que ela foi ensinada, ele jamais tirou um dez.

A minha esposa faz parte desse grupo: o grupo das grandes mulheres. Desde nova, menina guerreira. Sempre soube o que quis da vida. No trabalho luta bravamente, com garra, fibra e muita, muita honestidade. Por dedicação aos filhos e pela preocupação de formá-los bem, abdicou de promissoras carreiras no serviço público. Não é à toa que sua estrela profissional nunca deixou de brilhar. Depois do trabalho, não sei onde arruma energia para os problemas domésticos que ficam por resolver.

Faz parte de sua essência preocupar-se com todos, com sua família - principalmente com a mãe -, assume todos os procedimentos. Sempre bem assessorada por vários colaboradores, eles vão contribuindo para um melhor final de estada da D. Alice nesse mundo. Mas não é só a família; todos que estão ao seu redor e principalmente os que batem à nossa porta são por ela tratados com dignidade e respeito. Pelo que conheço dela, ao ser abordada por aquele que solicita ajuda, sua consciência é questionada sobre nossa responsabilidade sobre aquela pessoa. A Elzi é assim. Ela se preocupa com todos.

Com relação a mim, faltam-me palavras. Às vezes acho que ela não é desse mundo. Segundo alguns princípios da religião espírita, cada pessoa encontra-se em um plano evolutivo diferente do outro. Entre outras coisas, a doutrina de Kardec também afirma que cada um de nós tem um  potencial de entendimento e percepção da própria vida. Não sei quase nada sobre esse assunto, o que sei é o que me chega através de alguns amigos seguidores dessas primícias. Mas ousando dizer algo sobre o tema, acho que Allan quer transmitir que existem algumas pessoas que, além de ter um entendimento melhor sobre os problemas da vida, possuem uma capacidade maior que os demais no que diz respeito a vários aspectos da vida como: amor ao próximo, aceitação de problemas, sensibilidade, responsabilidade, honestidade e caridade. A Elzi está nesse grupo diferenciado. Ela consegue entender o que eu não consigo explicar. Ela providencia o que preciso sem que eu peça e às vezes acho que ela sabe o que penso. Para mim ela é um anjo.

Quando conheci e me apaixonei por minha esposa, não pensava o quão fantástica seria aquela criatura. Na época, tudo eram alegria e romantismo, e as agruras da juventude não deixavam imaginar que no futuro as coisas poderiam não ser tão tranquilas como naquela época. Hoje, diante de tantos problemas enfrentados, retorno meu pensamento a vinte e três anos atrás, precisamente na matriz de nossa cidade. Naquele altar, de frente ao Santíssimo Sacramento, e tendo um sacerdote como ministro sacramental, foi feita promessa de doação total de um para o outro, seja na saúde ou na doença. Também presenciaram o fato alguns padrinhos e uma igreja repleta de convidados que serviram de testemunhas.

Hoje fico imaginando o que seria daquela promessa fosse eu que estivesse no lugar dela enfrentando os problemas com tanta propriedade com que ela enfrenta. Não sei se daria conta do recado, pois naquela época não imaginava a dimensão e a profundidade dos obstáculos que a vida viria a nos oferecer. A ela agradeço a promessa mantida, sem sua companhia não sei como estaria minha vida hoje.

Elzi, hoje, 10 de Fevereiro, é o dia do seu aniversário. Gostaria de lhe agradecer muito por seu companheirismo e sua dedicação, além disso, tenho vontade de lhe dizer muitas palavras bonitas, mas como você sabe não sou bom nisso. Sei que você evita a exposição pública, mas achei que nossos amigos precisavam saber mais um pouco sobre você.

Enfim, o que importa é o registro de agradecimento que faço do seu amor, do seu carinho e da sua dedicação.

Um beijão e um feliz aniversário!


Gilberto Lobato

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

DE VOLTA À HEMODIÁLISE


Infelizmente acabou.  Depois de onze anos saudável, meu rim transplantado não aguentou mais a carga imposta sobre si. O fato é que, apesar dos momentos felizes vividos nesse período, houve também excesso de visitas aos blocos cirúrgicos. As várias intervenções cirúrgicas a que fui submetido minaram a resistência do nobre órgão. Assim, desde agosto de 2011, conto com a ajuda das máquinas de hemodiálise do Centro Nefrológico de Formiga.

Após quatro meses na nova experiência, continuo contando com a bênção Divina, pois tenho a sorte de poder dispor de um centro de hemodiálise de alto padrão na própria cidade que moro. Isso é privilégio para moradores de poucas cidades no Brasil; Formiga é uma delas.

Acho importante informar aos amigos de minha cidade e região, que nosso Centro é dotado de equipamentos modernos, equipe de médicos competentes, enfermeiros capacitados e corteses, bem como funcionários eficientes e educados. Completam o quadro, uma psicóloga e um nutricionista. No dia a dia do atendimento, além da experiência e a capacidade profissional empregada no processo do tratamento, são servidos aos pacientes lanches, almoço ou jantar, antes e após as sessões. Nosso Centro recebe também, pacientes de várias cidades da redondeza, que diariamente mandam suas “Vans” em direção a Formiga, mantendo viva a esperança de dezenas de pessoas.
Além de poder contar com o moderno Centro de hemodiálise pertinho da minha casa, estou tendo a certeza de que o tratamento está sendo eficiente. Os resultados da filtragem artificial me fazem sentir melhor. Agradeço a Deus por existir o processo de hemodiálise para os pacientes com insuficiência renal porque, fosse o problema em outro órgão, nem possibilidade do uso da máquina existiria. Portanto eu e os outros com problemas nefrológicos ainda podemos nos considerar sortudos.

A rotina e o modo de tratamento são mais ou menos assim: no início, as coisas são mais difíceis, pois para um paciente se submeter ao processo de hemodiálise, é necessária a confecção de uma fístula no braço. Fístula é uma modificação que se faz na veia, ligando-a a uma artéria. Ela se torna capaz de suportar um maior fluxo de sangue e pode ser puncionada com mais segurança. Essa mudança no organismo é uma cirurgia relativamente simples; porém atualmente essas intervenções estão sendo feitas em Divinópolis ou Belo Horizonte.
Acontece que esta fístula demora em torno de quarenta e cinco dias para amadurecer - ou seja, só depois de mais de um mês, o braço estará cicatrizado e preparado para receber as agulhas do aparelho. Dessa forma, até que se processe esse amadurecimento, torna-se necessário inserir um cateter em uma veia, para que o paciente possa ser submetido ao tratamento dialítico, até que a fístula esteja em condições de uso. Esse cateter é introduzido na veia cava superior, à altura do pescoço – jugular -. Não sendo possível interceptá-la nessa altura, o cateter é instalado na femoral, bem próxima à virilha. O cateter torna as coisas mais difíceis, pois incomoda e interfere nos movimentos do paciente. Porém, apesar de incômodo, o implante e o uso do cateter podem ser tolerados; exigindo, é claro, uma boa dose de paciência.

No meu caso, já são quatro meses tolerando o cateter, pois só agora consegui fazer a tal fístula. Como nem tudo são flores e as coisas sempre acontecem comigo acompanhadas de outros problemas, desta vez não foi diferente. Porém, desde o início do processo de hemodiálise, vem me atormentando com dor intensa, uma úlcera venosa localizada na perna (causada pelas várias tromboses, que foram causadas pelo câncer). Diante disso, os cirurgiões, temendo uma infecção maior, se recusavam a executar a feitura da fístula. Assim, com cateter no pescoço e às vezes na perna, venho administrando as inconveniências que a situação me impõe e vou tolerando os incômodos que me desafiam. Pelo que já passei, essa questão do cateter é “mole”. A hemodiálise, então, nem se fala; acho tranquila. Afinal, tudo isso tem me feito bem. Estou realmente muito satisfeito com o tratamento.

Já tive a oportunidade de fazer a filtragem do sangue através de um processo de diálise doméstico. Isso se deu antes do meu transplante. O tratamento consistia em trocar um líquido que era colocado dentro do abdômen, mais precisamente no interior do peritônio. Isto se dava também, através de cateter  implantado na região próxima ao umbigo. Esse líquido absorvia as toxinas do organismo num tempo de cinco a seis horas de ação. Depois, esse líquido era trocado por outro, em um processo que durava em torno de quarenta minutos. Essas trocas de líquidos aconteciam quatro vezes por dia: pela manhã, ao meio-dia, à tarde e à noite. Durante todo o período, executei cerca de três mil trocas desse líquido. Depois de dois anos nessa lida, recebi de presente do meu irmão Gerson, um rim - o que me manteve vivo até hoje.

Sem perder a esperança de viver mais algum tempo, desta vez optei pelo processo tradicional de diálise. Resolvi experimentar, três vezes por semana, as quatro horas que a máquina exige para filtragem. Estou contente, pois descobri que optei pelo processo e pelo caminho certo, pois apesar da frieza da máquina e o fato da gente ter que possuir uma paciência “de Jó”, tudo é compensado pelo calor humano dos companheiros de hemodiálise. É muito gratificante chegar ao Centro de Hemodiálise e, juntamente com os demais, tomar café no refeitório antes da sessão. A maioria é gente muito simples e – apesar do sofrimento de cada um, todos são simpáticos e alegres; estão sempre sorrindo. E não é raro, que até dentro das salas de execução de diálise, volta e meia o riso aparece. Seja com piadas ou casos engraçados, os assuntos acabam envolvendo a todos em um clima positivo e alegre, apesar de tudo.

Dessa forma, vou continuar jogando minhas fichas na companhia desse pessoal. Lá, sinto-me integrar uma espécie de irmandade, onde flui uma energia que faz bem. Ao invés de me submeter diariamente ao processo de diálise peritoneal, na solidão de um quartinho que pode ser preparado em casa, é preferível estar lá, com a turma, nessa espécie de “comunidade”. Também, esta é uma boa oportunidade oferecida pela vida para se praticar a humildade. Afinal, evoluir espiritualmente é necessário.
A todos, um grande abraço. E não descuidem da saúde, principalmente da pressão arterial.



Gilberto Lobato
Cine & Foto - Submarino.com.br